sexta-feira, setembro 24, 2004


... Posted by Hello

Ilógica universal

Há uma linha tênue que une eu e ela.
Quanto ao o mundo? O mundo se equilibra na corda bamba, que se balança entre a vida e a minha esperança... Ok, tem hora que o universo terremota e que eu tenho certeza que ele, o mundo, vai cair... Mas eu e ela seguimos firmes, uma em cada ponta, sempre juntas, segurando o mundo.

Dizem que todos os seres fazem dois movimentos, assim como o mundo: um de rotação, outro de translação.

A translação dura a vida toda, a rotação um dia, normalmente.
Fico pensando na órbita disso e chego a estranha conclusão de que ela é imprevisível.
Transladar depende do sol, não é mesmo? Acontece que o nosso astro-rei particular muda sempre... Ele são pessoas, são sonhos, são medos. Ele são muitos e acho que é por isso que a vida das pessoas segue caminhos tão diferentes. Cada uma, a cada segundo, vai atrás de seu Sol do momento e nessa busca acabam se perdendo por aí.

A rotação é mais fácil, damos em torno de nós mesmos. Se bem que tem dia que perdemos nosso próprio eixo e o movimento fica difícil. As horas passam devagar, vez ou outra nos atropelam.

Definitivamente, há dias em que não há meio termo e ficamos tontos de tanto rodar... O bom é que a natureza é tão perfeita, que uma hora o dia termina, ainda que (ironicamente) demore meses.

quarta-feira, setembro 22, 2004

Pequenos prazeres

Hoje foi um dia glorioso! De manhã, sol. Torrada de pão amanhecido com manteiga – adoro! Fui recebida no trabalho de braços abertos... Não vou mais lutar contra o que é mais forte que eu, preciso lecionar! Provocar mais alunos, fazê-los sonhar... Contar histórias é bom, ser jornalista é fantástico; mas ajudar gente a contar suas próprias histórias rasga ainda mais o peito de felicidade.
Às vezes me pego sorrindo, como quem está apaixonada. Não a paixão fácil de suspiros e corpos que se entregam; uma outra, ainda mais arrebatadora, que inclui toda a humanidade; devora a vida!
Sinto-me um pouco Amèlie Poulain... Tenho andado mais devagar, olhado mais pro céu e ando me divertindo muito com os pequenos prazeres da vida. A vontade de escrever tem aumentado. Por falar nisso, preciso aproveitar o assunto: “prazer” e falar do Intereca.
Vencemos o interclasse da ECA, eu e as minhas amigas jornaleiras... Foi um campeonato pequeno, oito times... Mas como eu fiquei feliz de jogar! Suei como não fazia há muito tempo. Matei a vontade da moleca, e deixei ela se acabar de tanto jogar bola... Fiz gols, fiz amigos, matei a saudade. Coisas simples como o meu dia de hoje, que ficou ainda mais perfeito porque, nele, vi nascer a primeira flor daquele que acredito, será meu novo jardim.

Epifania Posted by Hello

terça-feira, setembro 21, 2004

Eu e as estrelas

Sou moça da cidade grande, mas nunca me acostumei com céu sem estrela. Cresci entre o topo de arranha-céus e a rua. Brincava de bola no meio da molecada e era a princesa no meu palácio. Minha avó fazia gemada, e trazia pra gente. Eu não gostava, mas sempre tomei. Fiquei forte, vó sabe das coisas! Houve um tempo que passei entre o campo e a cidade. Gostava do mato. Curiosa, descobri amoreiras e mamoeiros secretos. Pulava uns muros, ia pelas estradas de terra e dava nome aos passarinhos. De dia, eu ia pra escola em São Paulo. Passava as aulas sonhando com histórias, que um dia viveria, e me divertia no recreio ensinando meus amiguinhos a pegar tatu-bola no jardim. Comida de avó, barulho de sapo, capim molhado de orvalho, colo de mãe, pai herói, irmão companheiro. Mas o tempo passou...
Voltamos para a cidade e aqui eu terminei de crescer. Não cresci muito, é verdade! Mas a vida castigou um pouco, a família quase se desfez e eu virei gente grande. Reaprendi a dormir ninada pelo barulho dos carros e a andar mais rápido. Fui me acostumando a não respirar muito fundo. Comecei a usar relógio.
Vivi bem a adolescência. Fiz muitos amigos. Continuei fugindo, vez ou outra pro interior, e lá eu era ainda mais feliz. De cima dos morros eu matava a saudade da linha do horizonte. Nadava no rio e andava no mato sem medo nas noites de lua.
Cheguei à juventude madura, mas a poesia da minha criança preservou muito da minha inocência. O primeiro amor veio tarde, e partiu cedo demais. Não endureci... Continuei sonhando, e vivendo, e amando. Hoje mulher, ainda procuro as estrelas no céu escuro todos os dias, antes de fechar a janela. Vez ou outra, avisto alguma e faço um pedido – primeira estrela que vejo, realiza o meu desejo! - Coisa de criança, de criança teimosa que teima em não se acostumar com céu sem estrela.

Hoje eu não durmo enquanto não ver alguma!

segunda-feira, setembro 20, 2004

O que há de mais importante na literatura, sabe?

"É a aproximação, a comunhão que ela estabelece entre seres humanos, mesmo a distância, mesmo entre mortos e vivos. O tempo não conta para isso. Somos contemporâneos de Shakespeare e de Virgílio. Somos amigos pessoais deles(...) Eu pego num livro velho com reverência; sinto nele a substância inerente a toda criação do espírito: o desejo de alongar as fronteiras da existência, pela reflexão ou pelo sonho acordado..." (Drummond, 1987)

Eu e o Drummond

Sábado assisti a uma peça sobre Drummond. Um espetáculo simples, num teatro mais simples ainda. Lembrei dos teatros que vi por esse Brasil, improvisados; deliciosamente rústicos, adaptados sobre nenhuma estrutura, feitos de pura poesia.
Na peça, um ator se transformava em vários, declamava, suava... Havia pouco mais de vinte pessoas na sala, mas Drummond estava lá. Ele transpirava pelos poros do artista, escorria pela sua face e saltava do palquinho pra cima da gente.
Ele sentou ao meu lado, falou de amor ao meu ouvido, do meu amor. Assustei! Ele me conhecia tão bem!
Falou da vida, da infância em Itabira, da minha infância... Da pureza de todos nós e o mais importante falou de vida.
Saí leve, caminhei um bocado... Eu e os versos; eu e o Drummond.

quarta-feira, setembro 15, 2004

Coisas de não-entender

"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo." (Clarice Lispector)

Amor é dessas coisas de "não-entender". Ele chega de surpresa, pega a gente desavisada e vai ficando meio sem querer. Coisa parecida com uma gripe forte, das que se pega num dia de chuva de verão... A gente molha até a alma, o espírito fica encharcado... Dá uma dor no corpo e uma coriza lascada no dia seguinte, mas quem se arrepende? Um dia a gripe passa, por pior que seja, e o que fica é a lembrança danada de boa do dia da chuva. Quem entende?
Sei que de repente chove de novo, e a gente sai correndo sem hesitar...

sexta-feira, setembro 10, 2004

A fábula dos pedaços

Hoje tive a sensação viva de ter me perdido, e o pior é que tenho tido essa sensação frequentemente...
Primeiro um amor que adormeceu pela metade, depois alguns amigos que se perderam na mudança, agora minha irmãzinha mais querida tá de malas prontas pra ir viver no Rio... Qualquer hora acabo me perdendo de vez. Vou -me embora, vou-me embora e não há Pasárgada!
Ando pela cidade e às vezes encontro meus pedaços. Uma parte no metrô, entre a Praça da Árvore e o meu São Judas; um pedacinho no Ibirapuera; minha ingenuidade na Cidade Universitária, as pernas no Cepeusp e o cérebro revirado pelos cantinhos da Eca. Minha infância nas casas e ruelas do Belém; meus sonhos no alto de edifícios do centro. Caminho e vejo muitas partes do meu coração pela Paulista, espalhados em cada esquina procurando por mim...
Aceno pra eles, meus pedacinhos... Sinto seu gosto e chego a tocá-los. Penso em sair recolhendo um a um... Desisto. Seria impossível juntá-los. Descubro que é justamente em cada lugar desses que eu estou, e que é esta diversidade fragmentada que me faz inteira. Me entrego ao caos desse mundo chamado São Paulo e sigo deixando os pedaços. Só assim é que a cada dia me refaço.

quinta-feira, setembro 09, 2004

Cuide de seu jardim, que as borboletas virão visitá-lo...

No mistério do Sem-Fim,
equilibra-se um planeta.

E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro, uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta.

Por onde começar?
Começo é uma coisa estranha... Maravilhosamente estranha. Sempre gostei de começar a fazer coisas. Lembro de mim, ainda pequena, levando bronca da minha mãe porque queria experimentar de tudo. Começava milhões de coisas, e quase nunca ia até o final - eu já sabia o que eu queria desde cedo. Queria provar o mundo aos goles, tomar um pouquinho de uma coisa, um bocado de outra. Grande garota!
Começo é bom porque a gente nunca sabe onde vai chegar. O mistério do que vem pela frente fascina. Podemos nos reinventar a cada ponto de partida e descobrir a cada começo um mundo de possibilidades.
Tenho pensado muito em muita coisa. Lutado contra o tempo, que parece me devoar e sempre acho que estou deixando alguma coisa, que não estou dando conta... De fato deixamos, todos, coisas para trás o tempo todo. A verdade é que esse começo coincide com um novo começo, bem real, que estou tentando começar já há algum tempo.
O que me impede de conseguir? Uma nostalgia barroca de uma vida dividida por duas. Uma ânsia maluca por um encanto que se perdeu sem querer...
Tento me libertar de um passado recente, pleno de paixão, de incertezas e da lembrança de um frio constante na barriga, que tem me feito muita falta.
E... Como sempre tive mais facilidade em começar coisas do que terminar, espero que o blog me ajude a me reinventar.
Que esse seja, senão o recomeço, um novo começo... Um novo, que já nasce com a certeza de que muito outros virão, antes ainda que esse termine. E é essa a beleza da vida!