quarta-feira, agosto 04, 2010

a ilha PEQUENITA

Ela reinava absoluta na porta da casinha pau-a-pique. De lá estranhou nossa chegada. Correu pra dentro. Sumiu do meu alcance. Só consegui desarmá-la com o argumento que justificava a visita. Disse que tinha vindo de muito longe em busca de tempo: um único dia.

Pequenita estranhou o pedido esquisito, afinal tempo era o que ela mais tinha. Há anos, talvez desde sempre sobravam-lhe as horas.

Mesmo desconfiada daquela jovem, que era eu, PEQUENITA liberou as fronteiras. Me guiou por um mundo cercado pelo Rio São Francisco sem relógio e sem eletricidade, onde ironicamente tudo só acontece se realmente for necessário e na hora certa.

Deu fome, fomos pra canoa. A escolha da natureza, pescamos piranhas.
Era o que tinha e foi o que nos satisfez. Cozinhamos o peixe na água do rio, pinicamos, sim pq pinicar é preciso e ajuda a diminuir o risco de engasgar com os espinhos. PINICAR... Um verbo quase intraduzível que aprendi a conjugar na marra e na ponta da faca afiada. Sob o olhar atento de PEQUENITA, que se ria toda de minha inexperiência, e a essa altura me dava o primeiro sinal de afeição.

Quanto a mim? Como não se apegar àquela mulher? E como me apegaria nas próximas horas!
PEQUENITA tomou banho de rio, de vestido e tudo. Sem vergonha de mim, ou da câmera. E assim, sem pudor de viver como se deve me mostrou como se vive.

Pilão Arcada foi abandonada há mais de 30 anos, mas está tudo lá. Foram horas de caminhada pelas ruínas de uma cidade que desde então é toda dela. A igreja, as ruas, o que sobrou das casas, o vazio ganhava forma na medida da memória e da Imaginação Pequenita.

O pôr do sol no cruzeiro, no ponto mais alto do que um dia foi cidade me deu a dimensão da ilha. Uma benção divina traduzida na oração da rainha desse pedaço de Brasil, que naquele momento certamente ao pedir por ela, agradecia por nós. Aquela melodia mágica, de joelhos ajudava a explicar pra DEUS o que palavra nenhuma é capaz de dizer.