domingo, abril 23, 2006

Cana: primeira viagem


Foram cinco dias de sol quente, estrada e dum universo que, apesar das câmeras, só consegui captar mesmo na memória.
Ser quase-bóia-fria me mostrou onde dói o corte da cana.
Pequenos detalhes de milhares de anônimos. Gente que acorda antes da maioria do mundo e adormece enquanto o sol ainda se põe.
Esses heróis e heroínas armados com pouco mais que coragem enfrentam todos os dias o aspecto menos doce da cadeia da cana. Sete, oito, doze horas por dia, seis vezes por semana.
Para as mulheres, o sufoco é maior. Elas são minoria, são resistência.
Guerreiras, enfrentam as regras cada vez mais severas de produtividade, a tripla jornada: são mães, donas de casa e bóias-frias.

O corte que tira do campo uma das maiores riquezas do país também é corte de vida. Ela escorre pelos dez litros de suor de cada jornada, se perde nas quase trezentas mil repetições de movimentos: abraçar a cana, curvar-se sobre os joelhos, golpear embaixo, depois em cima e carregar o que sobra para o eito central.
A armadura de trabalho inclui uma composição de bota e caneleira que lembra a dos cavaleiros medievais. Medievais como os métodos de produção...
Viagem no tempo:
Campo de concentração?
Escravidão?
Cem anos depois da lei Áurea, quem cuida da turma ainda é o feitor. Cada um deles é responsável por quarenta homens, que controlam sem chibata, apenas com instrumentos métricos. Com eles calculam a área cortada, multiplicam cada metro quadrado de cana por treze, quatorze centavos... Nessa conta, esquecem de contabilizar uma ou outra tonelada e ao fim do dia não é preciso tronco algum: o castigo está dado e bem distribuído.

** Veja a reportagem: http://gmc.globo.com/GMC/1,,2465-p-M458204,00.html

segunda-feira, abril 17, 2006

Profissão: repórter

Contar histórias é antes de tudo um exercício de olhar. E quanto mais seu e mais parcial ele for, mais honesta será a reportagem.

A maioria dos teóricos defende o contrário. Eles que me perdoem, mas já há analistas demais no mundo! Gente que vive de cruzar dados, equilibrar pontos de vista, criar verdades genéricas de dentro de um escritório... Meu jeito de reportar consiste em olhar, ir até onde nasce a notícia e sentir onde aquilo me dói... Depois contar tudo do jeitinho que aconteceu, pra mim. Quase um ato antropofágico! Engolir e traduzir o fato com cada nuance e cada interpretação que só eu e minha experiência de mundo é capaz.

É como emprestar um instrumento óptico pra alguém enxergar o que está bem longe, ou bem perto... Permitir se conhecer pelo seu modo de ver e dar o testemunho que apenas você pode dar. Junto com ele vão seus medos, sua vivência, sua infância, seu caráter ou sua falta de caráter... É disso que o público gosta! O encantamento do jornalismo está nesse jeito único do repórter contar uma história. Nada tem a ver com a frieza hipocritamente imparcial que recheia a maioria das páginas de jornal, ondas do rádio e de televisão.

Começamos essa semana as gravações do programa... E o que mais me fascina é a possibilidade que ele oferece aos repórteres de exercitar seu olhar. Os temas serão explorados sob diversos pontos de vista. Cada um de nós dará voz a um deles.

Da soma das parcialidades, o telespectador poderá tirar suas próprias conclusões – e enquanto isso, eu devo me divertir bastante defendendo ou atacando, sem medo de ser parcial, cada um de meus personagens.

Que venham as grandes histórias!

sábado, abril 15, 2006

Apenas um sonho?

Chegou e veio caminhando devagar. Os olhos atentos, as mãos sem jeito, ora dentro, ora fora do bolso. De certo me procurava. Torcia por isso. Eu seguia ali, parada. O copo quase vazio. Ergui a cabeça e lhe encarei como que se quisesse chamar a atenção. E queria. Foram vinte, talvez trinta segundos de espera e eles se encontraram. Primeiro os olhos, depois o silêncio - ávido por saber o que dizer.

Vinha agora em minha direção devagar. O mesmo sorriso tímido, que eu havia imaginado tantas e tantas vezes. Não! Era ainda mais lindo! A euforia era tanta que eu mal me cabia. Respiração ofegante. Passos. A distância diminuía. Levantei e sem saber o que fazer, ofereci um abraço. Ficamos imóveis. Finalmente estávamos ali, tínhamos ido tão longe e ainda tínhamos tanto...

Nos conhecíamos pouco, de vista, de oi... Até o dia em que nos aproximamos. Era noite e era um sonho.

Eu caminhava pela Vila. Não sei de onde eu vinha, mas já andava há muito tempo. Um carro parou e de dentro, veio a oferta da carona. Aceitei. Seguimos conversando, como se nos conhecêssemos muito. Rimos à beça. Desci em casa feliz e só então descobri que sonhara.

Dias depois do sonho estávamos ali. Tudo por ser dito. Sem saber como e o quanto. Sorri, sorrimos.

Pedimos batata frita?

terça-feira, abril 04, 2006

Por um mistério difícil de entender...

As criaças sorriem em média 300 vezes por dia.
Um adulto, com sorte, sorri 30!

Por um outro mistério, deliciosamente também sem explicação, ou simplesmente por causa dessa coisa fofa que me aconteceu, hoje dei muito mais de 300 sorrisos...