- Bebendo de novo!
- A noite tá fria.
(silêncio)
- Tá boa pelo menos?
- Nada. Falta açúcar, pouco gelo. Já tomei melhores.
- Bom, você também já...
- Já.
- De novo...
- De novo, igual. Quer dizer diferente... Hun, admito, foi igual!
- Mais vodca? Te acompanho.
- Não me entenda errado, mas não quero vc por perto.
- Posso esperar no carro?
(...) Ou na cama?
- No carro sim, no quarto não. Me leva pra casa! Mas me faça um outro favor, me deixa dormir sem vc!
(silêncio maior ainda)
- E amanhã?
- Amanhã é de dia e eu me distraio. A noite é que dói.
- Por isso mesmo. Precisa de mim, agora!
- Preciso é de cada nervo descoberto,
(... ) Você já fez dos outros covardes o suficiente pra eu estar aqui. Ou de mim corajosa demais.
- Acha então que a culpa é minha?
- Não, só não me acho.
- Vamos embora? Eu durmo na sala.
- Não sei com quem ficou a chave de casa.
- Precisa de um chaveiro?
- Preciso é de alguém pra pular o meu muro.
quarta-feira, outubro 25, 2006
domingo, outubro 22, 2006
Respeitável circo
A missão não era das mais fáceis: encontrar um circo baiano que representasse o melhor da tradição circense nordestina. Como os circos têm que notificar as autoridades para se instalar, comecei fazendo contato com as prefeituras e delegacias de dezenas de cidades no interior da Bahia. Consegui conversar apenas com representantes de circos de médio e de grande porte. Percebi que não era por telefone que conseguiria essa história. A solução foi viajar e produzir a reportagem pessoalmente.
Do avião, eu comecei minha busca: vi um circo lá de cima! Em terra, o encontrei, mas o circo não servia, era grande, muito comercial. Eu queria a rusticidade, a arte pela arte e pela sobrevivência. Viajei para o interior do estado, encontrei circos picaretas, circos que ainda mantêm animais enjaulados em péssimas condições. Num fim de tarde, na periferia da cidade de Eunápolis, no sul da Bahia avistei um palhaço. Ele caminhava sobre pernas de pau e, cercado por crianças, anunciava um espetáculo. Acompanhei o grupo. Instantes depois vi um circo pequeno, armado num campinho de areia, a lona remendada e um tapume como bilheteria.
Fui recebida com hospitalidade. Os artistas que viviam ali eram ainda mais simples que o lugar. Em poucos minutos acabei encantada com as histórias da trupe. Seduzida pela humildade daquela vida que eu só conhecia dos livros e da imaginação: amores, sonhos, precariedade, dor, alegria. Não tive dúvidas, minha busca havia terminado.
No dia seguinte, gravamos.
(Veja a matéria clicando aqui: http://gmc.globo.com/GMC/1,,2465-p-M558788,00.html
quinta-feira, outubro 12, 2006
Gato mia!
Era cedo.
Um grito anunciava o começo do jogo! Com a luz apagada a gente se escondia no quarto e ficava miando até ser encontrada.
No final desses encontros, apostávamos corrida entre dois postes da calçada.
Quem vencia não importava. Os quatro primos sempre ganhavam.
Era muito cedo. Era nossa infância.
Do quarteto, uma amizade era a mais especial: éramos as "primas N", Nádia e Nicolle!
Nos tempos de vida no campo, nos nossos anos mais divertidos, dividimos o que a gente tinha de mais valioso.
A Ni foi minha melhor amiguinha. Juntas, criamos incontáveis brincadeiras... Fomos inventoras, poetas, aventureiras, professoras, desbravadoras de mundos que só a gente conheceu.
Hoje, vasculhando a memória, encontro as passagens secretas de tantos desses universos que não cansávamos de descobrir no meio do mato e... eu queria muito que alguma dessas passagens a trouxesse pra perto de mim.
Não traz.
A única forma possível de reencontro me parecem as palavras.
Queria saber traduzir de alguma forma os rios de lembranças cheios de saudade que inundam a criança que ainda vive dentro de mim – criança que certamente segue com ela. Só nesse encontro consigo chegar um pouco mais perto da menina Nicolle.
Dentro de mim ela corre, e brinca e me sorri como se nada tivesse acontecido nos últimos anos que nos levaram pra longe.
Todas as nossas molecagens me parecem ainda tão reais!
Cada recordação tem cheiro, tem som. É terra, é mato, amoras; barulho de bombinhas, do vento, dos passarinhos, da voz dela concordando comigo... Topando mais uma aventura, a invenção de um novo lugar.
Não lembro quando paramos de apostar corrida na rua. Mas desde lá, nossas vidas seguiram rumos diferentes.
Nossa imaginação fez de mim jornalista, dela arquiteta. Ni escolheu construir realidades, eu contar as histórias do mundo real.
Caminhos parecidos, caminho separado.
Crescemos, nos perdemos, mas isso não importa.
Vejo que ainda que com 26 anos, pra mim nosso tempo não passou. Aqui dentro, a Ni ainda é aquela garotinha corajosa que acreditava sempre em mim e topava qualquer brincadeira!
É como se a gente tivesse parado o tempo na melhor fase da vida, em que fomos somente inocência!
Não por acaso, hoje, ironicamente no dia das crianças ela foi embora, levando qualquer possibilidade de deixar de ser pra mim e pra sempre apenas(?) infância.
Também hoje, descobri que ela ainda me ama. Foi aqui na internet - que sei que era um de seus brinquedos atuais preferidos (ela faz parte de uma comunidade criada pra mim no orkut... Só agora percebi.)
Não tive a oportunidade de dizer a ela que eu também a amo. Nossa amizade nunca foi de declarações, foi ação. Mas sei que ela sabia, sempre soubemos.
Agora no quarto, de noite... Num escuro parecido com o dos tempos do gato mia, escondida da minha própria tristeza, deixo que nossas melhores lembranças me encontrem. Sei que essa é a maneira mais bonita de a gente matar a saudade!
Assinar:
Postagens (Atom)